quinta-feira, 20 de janeiro de 2022

Roll Over And Die (ROAD) : Capítulo 08 - A Dualidade da Pureza e a Mulher da Luz

 

Capítulo 08:

A Dualidade da Pureza e a Mulher da Luz.

            “Obrigado! Você não sabe o quanto me ajudou!”

            Uma vez que Flum devolveu a bolsa para o seu dono, o homem pegou as mãos dela e apertou-as com entusiasmo, as lagrimas surgiram nos cantos dos seus olhos. Olhando de perto, ele tinha uns 30 anos, embora sua postura corcunda e as profundas rugas no seu rosto o faziam parecer muito mais velho. De qualquer maneira, definitivamente não deveria estar sozinho no perigoso Distrito Oeste.

            “Sinto muito, parece que esqueci meus modos. Meu nome é Leitch Mancathy. Eu administro uma loja simples nas proximidades.” Se apresentou como um cavaleiro e terminou com uma reverencia cortês. A qualidade da sua bolsa, sua roupa e seu comportamento lhe davam um ar de refinamento.

            Também havia algo no seu nome, Mancathy. Flum sentiu que já havia o escutado antes, e também recentemente, mas não podia se lembrar.

            Milkit tocou Flum no ombro e si inclinou para lhe sussurrar no ouvido. “Esse símbolo na bolsa. Não é o mesmo que o do restaurante onde jantamos?”

            Antes de voltar para o Distrito Oeste, fizeram uma parada na grande praça comercial que vende alimentos frescos. Agora que Milkit mencionou...

            “Oh, é verdade! Te conheço, de Shoppe Mancathy? Mas... aquele lugar não é nem remotamente pequeno!”

            O homem, no entanto, se manteve humilde. “Ainda é um trabalho em progresso, veja.”

            Shoppe Mancathy era a maior loja de toda a capital e era frequentada por quase todos os que ali viviam. Flum não podia entender o por que que o dono de um estabelecimento tão famoso falava com tanta amabilidade e humildade a um simples escravo.

            “Posso te perguntar o seu nome, senhorita?”

            “Eu, eh, sou Flum. Sou uma aventureira aqui no Distrito Oeste. E essa aqui é Milkit.”

            Milkit fez uma cortês reverência. “Estou aqui para apoiar a minha Ama.” Realmente parecia estar adotando o papel de uma criada, como se estivesse inspirada pela sua nova roupa.

            “Flum e Milkit, sim? É uma verdadeira honra. Agora, se posso ser atrevido, acho que eu já vi o seu rosto em algum lugar, senhorita Flum.” Leitch levou a mão ao queixo como se estivesse perdida em seus pensamentos. Flum sentiu como se o coração fosse sair pela boca.

            A jovem freira assentiu com a cabeça. “Você sabe, estava pensando exatamente o mesmo.”

            Flum se perguntou por um momento se haviam ouvido falar dela antes. Depois de tudo, ela costumava ser um herói... um membro do grupo enviado para matar o Lorde Demônio. Não seria surpreendente que um membro da igreja à qual María pertence e um homem cujo ganha-pão girava em torno de conhecer pessoas a tivessem visto.

            Flum tentou rir deles, talvez de forma óbvia de mais. “Provavelmente é só a imaginação de vocês, acho. Ha... hahaha.”

            Felizmente, ou infelizmente, os dois pareciam terem acreditado nela. “Eh, entendo. Peço desculpas pelo mal entendido.”

            “Não se preocupe por isso, não é nada1” Flum sentiu uma pontada quando alguém pede desculpa quando, na verdade, eles estavam certos.

            “E você, senhorita...” Continuou Leitch, dirigindo-se a freira. “Suponho que é uma mulher santa.”

            “Quem? Eu? Sou Sara Anvilen, você não sabe? Como pode ver, estou trabalhando duro para servir a Origem.” Suas raízes como garota de interior eram evidentes na sua forma de falar. No entanto, combinava muito bem com ele.

            “Ah, então você é da igreja! Obrigado pela sua assistência. Não posso expressar minha gratidão pela sua amabilidade.”

            Sara colocou as mãos na cintura e estufou o peito.

            “Você não precisa me agradecer, vovô. Derrotas os valentões é parte dos deveres de uma freira.”

            Flum sempre havia pensado nas freiras como mulheres puras e elegantes que eram um pouco fracas... nada como essa garota endurecida pela batalha. O cara deitado a seus pés provavelmente também não esperava.

            “Então, o que fazemos com esses punks?”

            “Agora que eu recuperei minha bolsa, pessoalmente eu acho que não há mais nada o que fazer.”

            “Você provavelmente tem razão. O tratamento que demos a eles tem que ser suficiente.”

            Vão deixar eles irem? Flum podia entender se os culpados fossem só pessoas pobres que estavam fazendo uma tentativa mal planejada de roubar algo, mas os bandidos eram aventureiros, e acima do Rank D. Esses caras provavelmente só eram ambiciosos e buscavam dinheiro rápido. Ela duvidava seriamente que uma surra os faria se arrepender de suas ações.

            “Acho que deveriam estar presos. Se não, eles voltaram a fazer.” Flum estava segura disso.

            No entanto, Sara parecia discordar. “Você não acha que as pessoas vão fazer as pazes depois de uma boa surra? Sei que deixo de fazer o que eu estou fazendo cada vez que minha professora me da um golpe.”

            “Isso é por que você é uma boa pessoa. Esses... bandidos aqui precisam de algo um pouco mais extremo para aprenderem a lição.”

            “Isso é... isso é uma realidade um pouco triste.”

            O fato de que Sara achasse isso triste confirmou as suspeitas de Flum sobre a bondosa que ela era na verdade. Inclinou-se um pouco para ficar na altura dos olhos da freira.

            “Bem, sim, é um pouco triste. Mas também é a verdade. No entanto, com um pouco de trabalho, talvez algum dia eles possam se converter em pessoas melhores. Como você.”

            “Está bem, eu entendo.” A tristeza de Sara desapareceu tão rápido quanto veio, o que ilustrava ainda mais sua alegre inocência. “Nesse caso, provavelmente deveríamos chamar os guardas, ou talvez os cavaleiros da igreja. “O que você acha senhor Leitch?”

            “Visto que a senhorita Flum mora no Distrito Oeste, acho que o melhor é confiarmos no seu critério.”

            “Ok! Então chamarei os cavaleiros. Conheço alguns deles.” E com isso, Sara saiu correndo antes que Flum ou Leitch tivessem sequer a oportunidade de responder. Viram-na desaparecer ao longe como um tornado que acaba de arrasar uma cidade.

            “Certamente está emocionada.” Disse Milkit.

            “Dá pra ver. Ah, a exuberância da juventude...” Murmurou Flum.

            Leitch riu com ironia. “Ambas são muito jovens, sabia?”

            “Sim?”

            O olhar gentil de antes foi substituído por um de grave seriedade quando o homem mais velho encontrou o olhar de Flum. Ela sentiu tensa de surpresa com a rapidez que seu comportamento mudou.

            “Sabe, antes eu estava procurando um aventureiro talentoso. Me pergunto se você estaria interessada em aceitar um trabalho para mim.”

            “Um trabalho?...”

            Agora ela era oficialmente uma aventureira, mas a ideia de aceitar um trabalho de alguém que acabava de conhecer, muito menos o dono de Shoppe Macanthy, era difícil de entender. Ela não era exatamente contra isso, mas pensou que quase com certeza seria um trabalho muito grande.

            Flum olhou para baixo em tom de desculpa.

            “Para ser honesta, sou somente uma aventureiro de Rank F. Realmente não sou tão forte.”

            “Sério? E pode fazer tudo isso?”

            “Bom, na verdade, me converti em uma aventureira ontem. Pode comprovar por si mesmo usando Escanear, si assim desejar.”

            “Você... todas as suas estatísticas são zero? Então, como você luta assim?”

            Flum olhou seu equipamento. “Tudo é graças a isso.”

            As maldições nos seus equipamentos definitivamente deram a ela estatísticas mais altas do que um aventureiro Rank F médio. Mas ainda era muito nova nisso tudo, e Flum sabia que o conhecimento e a experiência desempenhavam um papel importante ao determinar a habilidade de um aventureiro. Não tinha a confiança suficiente para afirmar que era algo mais do que Rank F.

            “Mas mesmo com estatísticas tão baixas, você conseguiu derrotar esse homens com facilidade.”

            “Realmente não foi nada....”

            “Uau, eu diria que seu Rank é muito baixo por que as pessoas ainda não se deram conta da quão talentosa você é. E justamente um aventureiro relativamente desconhecido seria excelente para meus propósitos.”

            Flum teve uma estranha sensação de apreensão diante disso. Preferir a um aventureiro relativamente desconhecido significava somente uma coisa: que queria manter esse assunto em segredo. O fato de ele estar tentando contratá-la diretamente, no lugar de passar pela guilda, o fazia ainda mais suspeito.

            Leitch pareceu se dar conta da preocupação de Flum, por que sua expressão se suavizou instantaneamente. Pareceu decidir que era melhor se explicar. “Minha esposa adoeceu, sabe?”

            “Sinto muito ouvir isso. Mas você não deveria ir na igreja e buscar um curandeiro?”

            “Infelizmente a magia não pode curar a condição da minha esposa. Falei com um sacerdote e ele simplesmente me disse que acreditasse na minha esposa e que ela teria que sair dessa por sua conta.”

            Milkit ficou visivelmente tensa diante disso, sem duvida se lembrando dos efeitos da toxina mustardo no seu rosto.

            Isso só podia significar...

            “Depois de consultar um pouco de literatura, encontrei uma menção de algo que poderia cura-la.”

            “Ahhh. E por isso quer me pedir que eu aceite o trabalho?”

            Se passava pela guilda, provavelmente voltaria para a igreja, já q estava tentando fazer algum tipo de medicamente fitoterápico... algo que um homem como Leitch queria evitar. Depois de tudo, a igreja expulsou os médicos profissionais do reino em busca de benefícios próprios. Nem sequer era historia antiga. Ainda escutava com frequência que os fabricantes clandestinos de medicamentos foram descobertos e acusados do delito de fabricação ilegal de drogas.

            Leitch baixou os olhos para o chão.

            “Minha esposa está piorando a cada dia que passa. Temo que, si não atuo agora para conseguir o remédio que ela tanto precisa, pode ser tarde de mais. Claro, eu pagarei uma quantia generosa pela sua ajuda. Entendo que um trabalho realizado fora da guilda não contará para subir de rank, então eu tenho a intenção de pagar mais para compensar.”

            Para ser franca, Flum não podia ter deseja uma oportunidade melhor. Pelo que ela podia dizer, esse trabalho não ira ferir ninguém e a salvou de ter que lidar com a escória da guilda. Sem falar neles negando sua parte nos ganhos de um trabalho bem remunerado como esse.

            “O que você acha, Ama?”

            Flum levou um dedo ao queixo de forma pensativa. “Hmm...”

            Apesar de todas as recompensas potenciais que oferecia o trabalho, também carregava um grande risco. Se a igreja as surpreendia durante o ato, Flum poderia se encontrar em problemas ainda maiores dos que já tinha. Por outro lado, também queria fazer isso por Leitch. Era obvio que sua esposa significava muito para ele, e só isso já era suficiente para tomar uma decisão.

            Flum se virou para Leitch. “Estaria honrada em aceitar seu trabalho.”

            Com essas palavras, o olhar cauteloso no rosto de Leitch desapareceu, deixando para trás um sorriso brilhante. As lagrimas começaram a brotar nos cantos dos seus olhos, traindo tudo o que o homem havia suportado.

            “De verdade? Obrigado, muito obrigado! Os deuses mercantis realmente estão sorrindo para mim!” Juntou as mãos em oração e as levantou para o céu enquanto as lagrimas corriam livremente pelas suas bochechas.

            Depois de esperar um momento para que se acalmasse, Flum decidiu pedir mais detalhes. “Onde posso encontrar essas ervas?”

            Sua expressão se escureceu. “Na verdade... não sei. O livro menciona uma flor azul conhecida como kialahri, mas isso é tudo o que estava escrito nele.”

            Levando em conta os esforços da igreja para se desfazer de todos os livros de medicina a base de ervas, era nada menos que um milagre que nem sequer isso havia sobrevivido. É quase certo que Leitch teve muitos problemas para conseguir aquele livro, na esperança de salvar sua esposa.

            “Entendo. Então, você gostaria que eu fosse busca-la.”

            “Assim é. Sei que parece uma idiotice ir buscar uma erva quando nem sequer posso dizer onde a encontrar, mas infelizmente não tenho opções.”

            Sonhava desesperado. Mesmo Flum se sentia insegura em aceitar esse trabalho, considerando que ela não tinha nada para continuar, mas...

            “Aceito sua solicitação e eu juro que não me renderei até que eu a encontre.”

            Depois de tudo, conhecia alguém bem versado nas artes da fitoterapia. Se pudesse a encontrar, poderia ter uma oportunidade. O único problema era se realmente ajudaria Flum.

            As palavras de Jean voltaram para a sua mente.

            “Oh, duvidaram, certo. Mas eles finalmente concordaram que era o melhor.”

            “Além disso, sejamos sinceros, você era uma carga muito grande para eles do que para qualquer outra pessoa.”

            Todos no grupo odiavam ter ela por perto, ao menos podia acreditar no que disse. As palavras de Jean se cravaram profundamente no coração de Flum, quase como um ácido que lentamente a devora. Se tiver razão, parecia pouco provável que Eterna os ajudasse.

            “No entanto, pode levar algum tempo.”

            “Minha esposa não tem muito tempo nesse mundo, mas nesse momento não estava em grave perigo. Tudo o que posso te pedir é que trabalhem o mais rápido possível, mas eu entendo que não é de muita ajuda. Tenho toda a informação que eu consegui reunir sobre o kialahri na minha casa. Visite-nos quando você tiver a oportunidade.”

            “Entendido.”

            Com uma sincronização impecável, Sara se reuniu com eles justo quando a conversa estava terminando. Dois soldados vestidos com uma armadura de chapa branca chegaram atrás dela.

            “Ed, Jonny, por aqui!”

            “Uau, parece que essa vez tem um monte dele. Arrastar eles vai ser um incomodo...”

            “Ei, você deveria estar feliz pelo trabalho. Agora rápido e levem esses bandidos para longe daqui.”

            O soldado chamado Ed riu e acariciou carinhosamente a cabeça de Sara. “Eu deveria ter esperado quando foi você quem relatou o incidente.”

            Ela se retorceu de incomodo e tentou afastar sua mão, embora estivesse claro pela forma em que se comportou entre eles que os três eram muito próximos. Os cavaleiros conjuraram um anel mágico de luz e o usaram para atar os homens inconscientes. Depois de pedir para Leitch, Flum e Milkit uma breve declaração sobre os acontecimentos, os homens foram arrastados.

            Sara os saludou com entusiasmo quando se afastaram. “Desejo-lhes sorte!”

            Flum teve a impressão de que a garota estava correndo sem parar desde que se foi um pouco antes. Estava coberta de suor, mas também estava radiante de orgulho. Essa jovem freira certamente transbordava energia.

            Uma vez que os cavaleiros saíram da vista, Sara se dirigiu a Flum. “Eu realmente espero que esses garotos melhorem sua aptidão quando saírem da prisão.”

            “Eu também. Com um pouco de sorte, mudarão suas vidas.”

            Ela também estava falando sério. Ajudaria a melhorar a má reputação que tinha o Distrito Oeste e também tiraria de Dein um ou dois dos seus comparsas.

            “Então, ei, Leitch. Havia algo que eu queria te perguntar.”

            Leitch respondeu casualmente. “Sim?”

            Sara inclinou a cabeça para um lado enquanto inspecionava seu rosto de perto. “Você está preocupado com algo, verdade? Conte-me... sobre algum tipo de fitoterapia, talvez?”

            Flum sentiu seu coração começar a acelerar. Como ela soube...?

            Leitch parou por um breve momento antes de responder com um rosto tranquilo. “Hm, de jeito nenhum.”

            No entanto, Flum podia sentir que seu coração batia a um ritmo muito parecido com o dela. Depois de tudo, não como Sara ter escutado sua conversa. Então, por que perguntaria isso?

            “Hmm, entendo.”

            “E o que te fez achar isso?”

            “A expressão no seu rosto me lembrou de alguém que eu havia conhecido antes. Vocês pareciam exatamente iguais e tinham um problema similar. Mas, você sabe, por ser uma freira e tudo isso, não é como se pudesse me pedir ajuda, então eu estava pensando que, se você tiver o mesmo problema, eu poderia procurar ela e consegui-la.”

            “Você, membro da igreja, proporcionar para alguém remédios à base de ervas?”

            “Quem se importa com isso? Meu trabalho é ajudar os necessitados. Ao menos isso é o que a senhorita María sempre me ensinou!”

            “María...?”

            Os olhos de Sara adquiriram um brilho de admiração.

            “María é incrível! Nesse momento ela esta em uma viagem heroica, mas sempre cuidou de mim quando estávamos juntas na igreja.”

            Agora Flum estava segura de que estavam falando de María Affenjenz, embora houvesse uma pequena brecha entra a María que Flum conhecia e a que Sara descrevia. Era verdade que María era amável, mas cada vez que se encontrava cara a cara com um monstro, seu comportamento mudava completamente. Além disso, assim como Jean havia apontado com tanta alegria, María nunca se incomodou em usar sua magia curativa em Flum, questionando a quão “santa” era realmente se podia diferencia tão facilmente entre aqueles que mereciam amabilidade e aqueles que não.

            Para ser honesto, Flum ainda podia ver certa logica. Havia sido uma inútil em praticamente todos os aspectos do grupo, então pode ter sido fácil para María considerar ela indigna.

            “Sinceramente, acho que é estranho que a igreja proíba o uso de remédios. Se podem curar as pessoas de doenças que a magia não pode curar, então devemos usar tudo o que possamos! Mas, eh, não fale para ninguém que eu disse isso, ok? Os funcionários da igreja ficariam muito bravos.”

            Os três trocaram olhares de surpresa diante dos comentários de Sara. Isso não era algo que esperavam escutar de um membro da igreja. Leitch olhou para a jovem com um olhar sério, como se a analisasse cuidadosamente para ver se podia confiar nela.

            “Entendo seus sentimentos, especialmente considerando tudo o que a igreja fez. Mas por favor compreenda que eu quero ajuda-lo em tudo o que eu puder, Sr. Leitch. Além disso, a igreja ainda tem algumas reservas de ervas!”

            “A igreja tem ervas?”

            “Só algumas, mas sim. Eu mesma as vi.”

            A mente de Flum vagou por um momento sobre que uso podia ter para a igreja ter ervas consigo. No entanto, isso não importava nesse momento... não se tinha alguma informação sobre onde podia encontrar a erva kialahri.

            Leitch tinha duas decisões difíceis diante dele: claramente era melhor não falar sobre isso e se arriscar mais do que já havia feito, mas falar com ela também poderia resolver muitos dos seus problemas.

            “Levando em consideração, acho que podemos confiar nela.” Disse Flum.

            “E o que te faz acreditar nisso?”

            “O olhar de inocência nos seus olhos, de verdade. Em minha opinião, ela não parece estar mentindo, e geralmente sou boa jugando caráter.”

            Leitch fechou por um momento para pensar. Quando os abriu de novo, estava claro que havia tomado uma decisão. “Se essa é sua opinião, então...”

            A precaução era a chave para ser um homem de negócios, mas também era saber quando confiar nos demais. Ambas qualidades haviam ajudado Leitch a transformar Shoppe Mancathy no enorme complexo que agora era. Esses anos de experiências serviram agora de base para sua decisão.

            “Bom, na verdade tenho um problema com algumas ervas medicinais, senhorita Sara.”

            “Eu sabia!” Sara sorriu.

            “Veja, minha esposa adoeceu e preciso adquirir uma erva medicinal chamada kialahri se quiser cura-la.”

            “Kialahri? Hmm... Nunca ouvi falar dessa, mas aposto que encontro algo se eu investigar um pouco!”

            “Ficar feliz em escutar isso. Eu já pedi para a senhorita Flum me ajudar a encontra-la, então provavelmente vocês duas possa trabalhar juntas. Te pagarei, claro.”

            “Não há necessidade disso, vovó! Ajudar as pessoas é meu trabalho e, além disso, recebo um estipêndio da igreja.”

            Flum não deixou de admirar a devoção sem interesses da jovem para ajudar os demais. De fato, fez ela questionar sua própria moral, considerando a facilidade com a que havia aceitado o pagamento oferecido por Leitch.

            “Segura? A verdade é que...”

            “Sério, não precisa. Além disso, se os funcionários da igreja descobrirem que estou ganhando algo de dinheiro adicional ficariam com muita raiva. Já recebi chicotadas suficientes, muito obrigado.” O rosto de Sara se escureceu e inconscientemente esfregou a parte inferior das costas, como se lembrasse de um doloroso incidente do passado.

            Isso fez Leitch rir um pouco. Se esse era o caso, que assim seja. E com isso, partiram para a casa de Leitch para começar a formular um plano para encontrar a erva kialahri.

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            Leitch deu para as três garotas a informação que havia reunido, e saíram por caminhos diferentes para ver o que podiam encontrar, e Sara imediatamente se dirigiu para a igreja para procurar os registros enquanto Flum revisava superficialmente todos os dados, livrarias e bibliotecas da capital. Para grande decepção de Flum, ambas voltaram com as mãos vazias.

            Dois dias depois da sua primeira reunião, Sara passou pela pousada de Flum e Milkit com um memorando escrito no que poderia ser caridosamente chamado de rabiscos. Segundo ela, no entanto, o que estava escrito ali era o nome da caverna na que foi encontrado o kialahri.

            Sara sorriu enquanto falava. “Demorei um pouco para escapulir, mas finalmente obtive a informação que estava buscando.”

            Aparentemente, os livros que contem informação sobre a erva kialahri foram guardados em algum lugar escondido da maioria dos membros da igreja. Flum sentiu um peso na consciência pelos riscos que Sara estava correndo por eles.

            Segundo o que Sara havia encontrado, a caverna estava localizada próxima a um povoado conhecido como Anichidey.

            “Aparentemente é uma cidade pequena do tipo: ‘Nem sequer tem uma pousada. Seria bom se pudéssemos encontrar alguém para ser nosso guia.”

            “Sabe, acho que já ouvi falar de um lugar chamado Anichidey.”

            “Não é dai que Stude, o pousadeiro, disse que é, Ama?”

            “Você tem toda a razão!”

            “Você se refere ao garoto super alegre de baixo?”

            As três garotas saíram apressadas da habitação para ir procurar Stude. Flum hesitou em descrever toda a situação da fitoterapia para ele, então mudou um pouco os detalhes, dizendo somente que havia aceitado um trabalho que a enviaria para Anichidey.

            Isso pegou Stude de surpresa, mas só por um momento, antes que seu doce sorriso voltasse e desse uma gargalhada. “Vamos, o que deu em você para ir para uma cidadezinha como essa? Bom, você realmente está com sorte! Minha família não só é dona da única pousada em Anichidey, como também eu estava pensando em ir visitar minha mãe.”

            Se ofereceu como guia antes mesmo que pudessem perguntar. Realmente era um cara legal.

            Agora que tinha um plano para conseguir os kialahri que tanto precisavam, as garotas se dirigiram para a casa de Leitch para atualiza-lo. Seus olhos se encheram de lagrimas de alegria quando soube da visita de Anichidey e do seu plano. Era um homem surpreendentemente emocional, pensou Flum em segredo. Na verdade, era muito impressionante que houvesse chegado tão longe como homem de negócios.

            Quando questionado sobre como fazer os preparativos para alugar uma carroça, Leitch insistiu em tomar conta disso, incluindo de todos os custos associados a viagem.

            “Agora que temos transporte e Stude para nos ajudar, acho que Milkit e eu podemos nos encarregar das coisas a partir daqui.”

            Era uma viagem de quatro dias até Anichidey e de volta, sem contar o tempo que passaria ali. Simplesmente não havia forma de que Sara ficasse tanto tempo fora da igreja. Ou isso pensava Flum. Contudo, Sara resistiu à mera sugestão.

            “Eu também vou ir!”

            Depois de varias rodadas obstinadas de ‘não deveria’ e ‘irei’, finalmente Milkit interveio: “Não vejo nenhum problemas com isso, Ama.”

            Isso foi tudo o que precisou para inclinar a balança a favor de Sara e finamente Flum se rendeu. Quando expressou sua preocupação de que as pessoas percebessem que havia ido, Sara apenas sorriu.

            “Não se preocupe sobre isso. Nós, as freiras, sempre saímos para ajudar as pessoas.”

            Parecia confiante, então deveria estar tudo bem. Ou pelo menos, Flum esperava que assim fosse.

            Sua viagem estava marcada para a manhã seguinte. Sairiam com a primeira luz do dia.

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             A noite antes da sua viagem, Milkit estava deitada na cama, com a mente cheia de pensamentos e ansiedade devido que era a primeira viagem que ela faria em sua vida. Ficou olhando o teto escuro, incapaz de dormir.

            De repente, uma voz veio através da escuridão desde a outra cama. “Está dormindo, Milkit?”

            “Ainda não. Estou... nervosa, eu acho.”

            Flum riu. “Oh, você também?” Ela se sentia da mesma maneira. “Bem, então por que não conversamos um pouco?”

            “Acho que gostaria.”

            “Hmm... Bom, então, do que deveríamos conversar? Umm...”

            “Nesse caso, posso te fazer uma pergunta?”

            “Mas é claro! Desembucha.” A voz de Flum adquiriu um tom animado com a perspectiva de Milkit mostrar algum interesse por ela.

            “Alguma vez você já viajou para algum lugar antes, Ama?”

            Aparentemente, a pesar de todo o tempo que as duas haviam passado juntas, Milkit ainda não havia se dado conta do fato de que Flum já ter sido membro do famoso grupo de heróis. Talvez ela nem soubesse que o grupo existia, considerando que havia vivido sua vida como escrava. Até agora Flum havia evitado o tema, mas agora que Milkit havia mostrado certo interesse em aprender mais sobre ela, pensou que era hora de revelar algo sobre si mesma.

            Honestamente, provavelmente era melhor para sua relação que ela mencionasse antes que Milkit descobrisse.

            “Na verdade, viajei com os herói escolhidos.”

            “Oh?”

            Flum não podia ver seu rosto através da escuridão, mas estava claro pelo seu tom que Milkit estava confusa. Para ser justo, ela realmente não tinha muitas provas para apoiar suas afirmações.

            “Heróis... Poderia me dar um exemplo do que isso significa?”

            “Hmm. Bem, você sabe, como os heróis dos que você sempre ouviu falar. Estou certa de que você conhece Cyrill, verdade? Cyrill Sweechka?”

            “Eu ouvi falar dela, sim.”

            “Bem, viajei com ela, Eterna, Gadhio e algumas outras pessoas famosas durante vários meses.”

            Mesmo alguém tão desinteressada no que acontece no mundo exterior como Milkit havia escutado esses nomes antes. Ela rodou de lado e olhou para a escuridão na direção da voz de Flum.

            “Quer dizer que foi um desses heróis escolhidos, Ama?”

            “Assim é. No entanto, é difícil de acreditar no você vê agora.”

            “Acho você incrível, Ama.”

            Flum viu o intenso olhar de Milkit espiando através de suas vendas. Era um olhar de absoluto respeito e devoção. Deixou escapar uma risada nervosa quando seus olhos se encontraram.

            “Honestamente, não sou nada especial. Simplesmente fui escolhida por Origem e, portanto, me enviaram de viagem. Tudo isso antes que me vendessem a um traficante de escravos e me marcassem para sempre com essa maldita marca.”

            Mesmo agora, ainda estava desconcertada pelo fato que Origem a havia escolhido. Ela ainda costumava amaldiçoar seu destino, desejando que o deus houvesse a deixado ela sozinha.

            “Oh, então é por isso...” Milkit parecia convencida, mas ela não conseguiu adivinhar de quê.

            “O que é?”

            “Apesar de ambas sermos escravas, havia algo que parecia especial em você.”

            Ela estava falando da vez que se conheceram, quando ambas estavam presas juntas na cela do sótão. Havia algo em Flum que simplesmente chamou a atenção dela.

            “Olhei para você e me dei conta de que ainda havia certo otimismo em você. Não se parecia em nada com o que havia visto em outros escravos. Não podia entender o que estávamos fazendo na mesma cela húmida, mas agora tudo faz sentido, sabendo que recentemente você se converteu em uma escrava. Estou certa de que há algum lugar ao qual você pertence, Ama.”

            Flum esticou o lábio em aborrecimento. “Por que faz parecer que você já é uma causa perdida?”

            “Bem, por que isso é verdade.”

            “Se assim é como você se sente, então suponho que não tenho outra opção além de te levar comigo onde quer que eu vá.”

            “Você continua falando isso, Ama?” Apesar da sua tentativa de parecer preocupada, havia um indicio obvio de animação na voz de Milkit.

            “Você não gostou dessa ideia?”

            “... Eu gostei. E isso é o que é tão preocupante.”

            Flum sorriu. “Nesse caso, isso é bom.”

            Milkit também começou a rir, um som tão suave que facilmente poderia ter sido confundido com o barulho do vento. “Espero que nossa viagem amanhã saia bem.”

            “Sim, e uma vez que voltemos e nos paguem, vamos nos presentear com uma janta elegante.”

            “O almoço de hoje foi muito bom. Acho que eu nunca comi algo assim antes.”

            “Almoço? Isso não foi nada especial, sabe. Mas se você gostou, vamos repetir, ein?”

            Mais uma vez havia algo de emoção na voz de Milkit. “Vamos.”

            Enquanto as duas falavam durante a noite, suas preocupações sobre a viagem começaram a desaparecer, embora elas nunca tivessem partido completamente. De fato, quanto mais falavam, mais se esqueceram de que deveriam estar dormindo.

            Depois que isso continuou durando algum tempo, finalmente Flum aceitou a ansiedade que sentia e fechou os olhos. “Boa noite.”

            “Tenha bons sonhos, Ama.”

            E com isso, o silencia caiu sobre a habitação enquanto a lua continuava seu preguiçoso caminho pelo céu. Quando o sol aparecesse, começaria sua viagem.

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