Capítulo
07:
Das
Profundezas do Inferno a uma Vida Normal
Mesmo
depois de sair da guilda com uma notável quantidade de dinheiro, Flum e Milkit
estavam tendo dificuldades em conseguir um lugar para ficar devido à marca
óbvia na bochecha de Flum e as bandagens enroladas na cabeça de Milkit. Elas
continuaram a ser rejeitados mesmo antes de colocar os pés dentro do prédio. No
entanto, elas seguiram em frente, e finalmente encontraram uma pousada em ruina
em uma das favelas escuras do Distrito Oeste.
A entrada
dava para um restaurante com um homem de aparência entediada de pé no balcão, o
queixo com a barba por fazer descansando no seu punho enquanto deixava escapar
um bocejo. Seus olhos se iluminaram ao ver entrara as duas garotas.
“Bom,
olha isso! São vocês dois clientes, por casualidade?”
Deve
ter notado que eram escravas, no entanto a expressão no seu rosto deixou claro
que pessoalmente não importava. O homem saiu detrás do balcão com os braços
abertos, algo próximo a um sorriso de um vendedor apareceu no seu rosto.
“Bem
vindas, bem vindas a nossa humilde pousada! Já estava começando a me sentir
solitário devido à falta de clientes.”
Flum
se surpreendeu com a sua repentina mudança de comportamento. “Emm. Oi...”
“Posso
te perguntar o que te traz aqui? Faminta? Buscando um lugar para ficar? Um
pouco de ambos??”
“A-ambos,
suponho. Você sabe que somos escravas, verdade? Está bem?”
“Bah!
Dinheiro é dinheiro, não é mesmo? Além disso, provavelmente fecharei em alguns
dias. Gahaha!”
“Tenho
certeza que esse não é o caso...” Mas ao dar uma olhada no local, Flum não
tinha tanta certeza. Realmente estava completamente vazio. Começou a se dar
conta de que o homem não estava simplesmente sendo educado... realmente estava
feliz por ter clientes, escravos ou o que fosse. Talvez ele até os deixasse
ficar de graça.
“Infelizmente,
acredito eu que não vamos ter mais clientes tão cedo. Vocês duas poderiam ser
minha ultimas convidadas!”
“Por
que você não tem nenhum cliente?”
“Bem,
acabei neste tipo de lugar depois de deixar uma cidade chamada Anichidey com a
esperança de seguir meu sonho, mas infelizmente, não funcionou como planejado.
Suponho que não tenho bons olhos para negócios, hein?” O homem fez uma leve
careta, mas ainda assim conseguiu forçar um sorriso.
Provavelmente
tinha pouco a ver com o senso comercial e mais a ver com localização, pensou
Flum. Os bairros marginalizados do Distrito Oeste faziam que o resto do
Distrito parecesse bem educado em comparação. Muitas poucas pessoas arriscariam
sua vida ao ficar aqui, sem se importar com o barato que fosse.
A
boa noticia era que o pousadeiro parecia ser uma boa pessoa.
“Vocês
não se importariam se eu lhes perguntei seus nomes?”
“Sou
Flum, e ela é...”
“...
Milkit.”
“Flum
e Milkit, hein? Sou Stude. Tenham a segurança de que farei tudo que for
possível para me assegurar de que vocês tenham uma ótima estadia aqui, na minha
humilde pousada, embora não seja por muito tempo.”
Com isso, Stude lhe ofereceu a mão. Depois de um momento
de vacilação, Flum a apertou.
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Na
manhã seguinte, as duas se encontraram com uma refeição completa que consistia
em pão, sopa, salada, ovos, carne e peixe. A mesa estava completamente coberta
de comida... muita para tão cedo de manhã. Flum conseguiu acabar com tudo,
embora Milkit, que aparentemente não gostava muito de comida, não conseguiu
terminar sua parte. Stude não pareceu ofendido, mas deixou passar com um
sorriso, dizendo a eles que ele estava apenas limpando seus suprimentos.
Uma
vez que Stude estava fora de vista, Flum fez uma careta para si mesma e
sussurrou para Milkit. “Eu espero que ele também se cuide...”
Depois
do café da manhã, as duas se prepararam e partiram para o Distrito Central em
busca de algum lugar para comprar roupa nova. Agora, as roupas de Flum eram
pouco mais do que trapos após a batalha com os anzu, e não lhe agradava a ideia
de caminhar ao ar livre pela rua principal. Decidiram ir com o folgado pijama
branco que lhes haviam proporcionado na habitação da pousada. Estavam abrigadas
e não parecia tão ruim, embora dificilmente estivessem aptas de andar pela
cidade.
Em
primeiro lugar, se dirigiram a uma loja de roupa relativamente barata para
procurar algo para Flum. Elas finalmente iam entrar em uma loja na rua
principal, próxima do portão sul que conduz ao castelo.
Flum
cantarolava alegremente enquanto olhava para as várias calças penduradas
ordenadamente em seus cabides. Uma mulher que passava próximo dela franziu a
testa rapidamente quando viu a marca de escravo na sua bochecha, embora Flum
não parecesse notar.
Finalmente, seu olhar
pousou em uma saia xadrez na altura do joelho Flum paro em frente ao espelhou e
segurou-a em frente a sua cintura antes de se virar para Milkit.
“O
que acha?”
Milkit
parecia confusa, como se estivesse se perguntando por que alguém queria sua
opinião, mas finalmente procuro pela resposta certa. “Fica muito bem em você,
Ama.”
No
entanto, estava claro pelos seus olhos que tinha algumas duvidas sobre a
sabedoria de um aventureiro promissor vestindo uma saia, preocupada de que
pudesse limitar seus movimentos.
“Hmm,
você não parecesse convencida.”
“Não,
claro que não, Ama.”
“Se
você tiver alguma reserva, eu realmente quero ouvi-la, Milkit. Me ajudará
muito.”
Milkit vacilou por um momento...
“Tem certeza que quer que eu diga o que penso?”
Um escravo respondendo
com sinceridade só podia significar uma surra, independente do quão gentilmente
ele tentasse transmitir suas opiniões. O próprio pensamento fez Milkit sentir
um nó na garganta, como se para impedi-la de continuar falando.
Mas Flum não era como
seu amo anterior.
“Mas
é claro! Eu não pediria sua opinião se não estivesse querendo escuta-la. Então,
se deixe levar, Milkit.”
Milkit
reuniu coragem. “Nesse caso...”
“Sim?
Nesse caso...”
“Levando
em conta que você lutará contra monstros, eu acho... eu acho que as calças
seriam roupas mais fáceis de se mover e mais adequada para o trabalho.”
Flum
ergueu o punho e acenou com a cabeça, convencida. Pendurou a saia.
“Sabe,
você provavelmente tem razão. Obrigada, Milkit. Eu nem sequer pensei em como
isso afetaria minha movimentação na batalha.”
Milkit
levou as mãos ao peito diante do repentino elogio. Era tudo o que podia fazer
para permanecer de pé.
Flum
foi para outra seção da loja e puxou um par de shorts da prateleira. Mais uma
vez, os segurou contra a cintura e se virou para Milkit. “Que tal agora?”
Essa
vez Milkit respondeu facilmente. “Fica muito bem em você, Ama, e você deve se
mover mais facilmente.”
Flum
sorriu diante disso, satisfeita consigo mesma. “Muito bem, esse é um problema
resolvido.”
Ela
escolheu uma camisa simples para combinar, fez sua compra e foi ao provador se
trocar. A nova roupa casual mostrava sua pele bem bronzeada, uma recordação da
sua viajem. Agora se sentia muito mais confortável caminhando pela cidade, os
olhares que os pedestres lançavam agora eram muito menos críticos que os de
alguns momentos atrás.
“Bem,
isso é tudo para mim. Agora é sua vez, Milkit.”
“Estou
bem assim, de verdade.”
“Você
não pode continuar andando assim, não se vem comigo, Milkit. Não há nada que
você queira vestir? Graças a amabilidade de Stude, temos muito mais dinheiro do
que eu esperava. O que você quiser é seu.” Claro, não podiam pagar por um
vestido de gala caro, mas Flum tinha quase certeza de que Milkit não pediria
não pediria nada desse tipo.
Depois
de pensar um pouco, Milkit finalmente respondeu. “Eu... acho que gosto do que
estou usando agora.”
“Nop.
Você não vai se livrar disso com essas palavras.”
Elas
tiveram algumas trocas parecidas antes que Milkit finalmente ceder e dizer para
Flum o que queria vestir.
“Você
tem certeza que é isso o que você quer?” Perguntou Flum.
Milkit
saiu do provador, vestida com uma roupa de empregada preto e branco.
“Eu
devia te perguntar o mesmo, Ama. Você tem certeza que está tudo bem gastar essa
quantidade de dinheiro comigo?”
“Não
se preocupe com o preço, Milkit. Temos dinheiro mais do que o suficiente nesse
momento. Mas, realmente é isso que você quer usar?”
A
saia e o peito do vestido de Milkit tinham acabamento em renda e babados.
Honestamente, a roupa parecia claramente inadequada para os deveres de um
servente, mas provavelmente estava destinado mais as... inclinações únicas de
um amo, que ao trabalho domestico pratico. No entanto, as bandagens faciais de
Milkit complementavam de alguma forma o visual gótico geral do vestido,
portanto, Flum supôs que tudo se encaixava perfeitamente.
Milkit
brincou com a barra de sua saia enquanto ela se olhava no espelho.
“Frequentemente eu via vestidos como esse na casa do meu antigo amo e sempre
esperava a oportunidade de usar um.”
“Bom,
certamente fica fofo em você. Você quer ter isso?”
“O
desenho é realmente bonito. Bonito de mais para alguém como eu...”
“Não,
absolutamente! Não é só a roupa, mas todo o look. Você fica linda nisso,
Milkit. Com licença, comerciante!”
Flum
corou levemente enquanto animava sua amiga, embora Milkit lhe devolvesse um
olhar de incompreensão. Ela acenou para um funcionário da loja, quem
rapidamente se aproximou correndo para o seu lado. Quando ele viu a marca na
bochecha de Flum, no entanto, uma expressão de desgosto cruzou seu rosto antes
que ele conseguisse fazer um olhar de profissionalismo.
Flum
e Milkit pagaram e saíram da loja. As duas formavam um casal interessante, uma
escrava vestida com roupa informal de rua com uma manopla ensanguentada
pendurada na sua cintura, acompanhada de uma criada cujo rosto estava coberto
de bandagens. Tinham ido comprar roupa para evitar chamar atenção não desejada,
mas Flum estava começando a se perguntar se isso teria o efeito contrário.
Felizmente,
o Distrito Central estava completamente lotado de pessoas, desde compradores
locais até viajantes de terras distantes, todos ocupados com suas próprias
tarefas e prestando pouca atenção a Flum e Milkit. Sentia quase como se fosse
um festival em andamento, mas esse era só outro dia aqui na capital. Havia
gente suficiente caminhando pelas ruas para encher varias vezes o pequeno
povoado de Flum. Se parassem de prestar atenção onde pisavam por um momento,
corriam o risco de serem arrastados para o fluxo interminável de pedestres.
Flum
segurou a mão de Milkit e a arrastrou entre a multidão para se assegura de que
permanecessem juntas.
Ainda
tinha muito que comprar. Tudo o que precisavam para começar sua nova vida
juntas... ou ao menos, tudo o que podiam carregar. Por enquanto, Flum pensou
que era melhor limitar suas compras ao essencial: sapatos, roupa interior,
escovas de dente e produtos de banho. Também queria uma bolsa para quando
saíssem para trabalhar. Uma lanterna e uma faca também seriam úteis.
O
dinheiro poderia não ser o problema nesse momento, mas seu tempo continuava
sendo bem limitado. As duas se moveram tão rápido como puderam sem cansar
Milkit, indo a tantas lojas como puderam em sua viajem de compras. Foi um dia
bastante ocupado, mas também uma experiência inesperadamente valiosa para
Milkit, quem nunca antes havia tido a oportunidade de comprar coisas para ela.
“Obrigado
por vir!”
Os
lojistas também eram supreendentemente agradáveis, considerando sua condição de
escravas.
Agora
as garotas estavam completamente sobrecarregadas de bolsas de todas as formas e
tamanhos, mas a pesar da carga, conseguiram continuar segurando a mão uma da
outra enquanto abriam passo entre a multidão.
“Sabe,
isso foi realmente muito divertido.”
“Sim,
foi. Foi a primeira vez que vi tantos desses itens. Foi difícil se concentrar
na tarefa em questão.”
Flum
riu. “Tenho que admitir que eu estava um pouco sem palavras quando vi chegar o
vendedor com um grande sorriso no seu rosto, segurando esse fantástico conjunto
de talheres. Compra isso teria arruinado todo nosso orçamento!”
Milkit
olhou para o chão com vergonha. “Sinto muito... eu não tinha nem ideia que
custava tanto.”
De
repente, Flum parou de repente. Ela estava olhando para a placa pendurada na
loja diante delas.
“Posso...
posso parar aqui rapidamente?”
“Mas
é claro. Você pode fazer o que quiser, Ama.”
As
duas estavam paradas em frente a maior livraria da capital. Através das janelas,
Flum podia ver uma estante atrás da outra cheia de livros. O interior da loja
tinha um ar digno e estava cheio de figuras bem vestidas que pareciam nobres.
Isso tinha sentido, considerando que os livros eram itens muito caros,
geralmente disponíveis só para os ricos. Esse não era exatamente o lugar onde
normalmente se aventuravam os escravos.
Depois
de um momento de vacilação, as duas garotas se aventuraram em cruzar a porta
principal. Uma vez dentro, foram golpeadas pelo familiar aroma de tinta e de
papel... e imediatamente se encontraram com uma impressionante seleção de
textos religiosos para igreja de Origem.
Nos
velhos tempos, a grandes maioria dos livros eram propriedade exclusiva da
igreja, longe do alcance do homem comum. No entanto, a medida que crescia a
necessidade de uma população educada, também crescia o desejo por livros sobre
a igreja, a historia e outros conhecimentos. Isso impulsionou o país a
desenvolver tecnologia de impressão, mas os impressores e livreiros que
surgiram como resultado ainda estavam estreitamente associados com a igreja. Na
verdade, a placa na frente da loja estava marcada com um círculo estilizado e
entrelaçado... a marca de Origem, o Criador Divino.
Dito
isso, os textos religiosos não eram colocados na frente e no centro da loja
devido a algum tipo de acordo secreto com a igreja. Em vez disso, era
simplesmente por que vendiam bem.
Para
Flum e Milkit, no entanto, os textos eram de pouco interesse. Eles receberam
apenas uma olhada rápida em seu caminho para o mapa. Depois de olhar o mapa, se
dirigiram até uma área na parte traseira da loja.
“Você
gosta de ler, Ama?”
Flum
respondeu rapidamente. “Eh? Não estamos aqui por mim.”
Uma
vez no seu destino, Flum olhou por cima da fila de estantes antes de encontrar
o que estava buscando. Ela puxou-o para fora e inspecionou a capa de perto,
como se fosse um item de grande interesse.
Milkit
observava com grande curiosidade. Se Flum não estava comprando um livro para
ela, então por que estava ali?
“Então,
quem vai ler isso?”
“Eu
já te disse, lembra? Disse que quando as coisas se acalmassem um pouco, te
ensinaria a ler. Temos muito mais dinheiro do que o esperado, então eu pensei,
ei, por que não agora?”
“Você
falava sério sobre isso?”
“Que,
você pensou que eu me deixei levar pelo momento?”
“Bem,
realmente não pensei que alguém quisesse chegar tão longe por uma escrava
inútil como eu.”
Flum
estava começando a antecipar os comentários autocríticos de Milkit. Embora a
esquina de uma livraria não era exatamente o momento ou o lugar para tentar
acabar com eles, ainda considerava que era seu dever solene ajudar Milkit a
ganhar mais confiança para que deixasse de maltratar a si mesma.
E o
primeiro passo para faze-lo era fazer ela ser mais autossuficiente.
“Você
quer viver sozinha, Ama?”
“Não
pensei tanto nisso. Isso seria muito no futuro.”
“Mas
assumindo que aprendo e experimento todas as coisas que você deseja me ensinar,
e eu me torno capaz de viver sozinha, então...”
O
medo e a incerteza na voz de Milkit eram inconfundíveis. Flum entendeu seus
sentimento e tratou de aliviar algumas dessas preocupações.
“Não
se preocupe muito com isso, Milkit. No momento, nem sei como vou fazer isso
sozinha. Não te deixaria ir, mesmo se você quisesse ir.”
“Essa...
essa não é a primeira vez que me dizem isso.”
“Você
não confia em mim? De verdade acha que eu iria sozinha ou te abandonaria em
algum lugar?”
“Eu...
não sei muito sobre a confiança. Mas espero passar o maior tempo possível
contigo, Ama.”
Flum
riu novamente disso. “Você acaba de descrever a confiança, Milkit. Confiar em
alguém significa que você quer estar ao seu lado.”
“Isso
é... é isso que é esse sentimento?”
Milkit
levou as mãos ao peito, como se buscasse em vão a fonte da emoção que a
percorria. As vezes, quando falava com Flum, parecia que se coração estava
afundando e uma tempestade estava batendo em seu peito, o que dificultava
respirar. E, no entanto, para ela... gostou dessa sensação.
Então
isso era “confiança”. Dar um nome ao sentimento a ajudou a relaxar um pouco.
Flum buscou por um tempo antes de encontrar um bom manual
para crianças que pudesse usar para ensinar Milkit a ler. Uma vez no balcão
para fazer sua compra, Milkit deixou escapar um pequeno suspiro ao ouvir o
preço, mas Flum levantou a mão para evitar qualquer discussão e pagou
rapidamente.
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Depois
de sair da livraria, as duas pararam em uma papelaria para comprar alguns
materiais de escrita para usar nos estudos de Milkit, antes de voltarem
finalmente para a pousada. Seus braços estavam tão cheios nesse ponto que já
não podiam segurar as mãos, mas afortunadamente, as multidões muito menores do
Distrito Oeste fazia que isso não fosse um problema.
“Realmente
não sei se foi uma ideia tão inteligente gastar tanto dinheiro em uma pessoa
como eu...”
“Se
você é feliz, Milkit, eu também sou. Então não se preocupe tanto com isso, tudo
bem?”
“Realmente
não entendo como alguém pode se sentir dessa maneira.”
“Acho
que eu gosto da sensação de poder melhorar a vida de outra pessoa.”
“Temo
que eu também não entenda isso, Ama.”
A
ideia de que alguém simplesmente fosse amável com ela não parecia com nada que
Milkit houvesse experimentado antes, o que a confundia ainda mais. Seu amo
anterior havia sido amável com ela em certas ocasiões, mas geralmente era um
prelúdio para algo pior. Ele gostava de Flum de iludir Milkit para depois
destruir isso.
Assim
era a vida de um escravo vendido no mercado negro. Incapazes de suportar o
abuso emocional, muitos recorreram ao suicido apunhalando-se no pescoço,
enforcando-se ou até mesmo batendo a cabeça contra a parede... Tudo enquanto
seus amos riam como hienas diante da visão. Mesmo a morte não lhes
proporcionavam uma salvação verdadeira.
Milkit
havia aprendido a negar a si mesma qualquer sentimento de alegria, não
importando qual gentileza fosse oferecido ou dada. Era uma forma de autodefesa.
No entanto, algo lhe dizia que Flum não a trairia. Estava começando a compreender
esse conceito de “confiança”, embora ainda a preocupava. Como ela deveria
retribuir essa garota que tinha feito tanto para fazê-la feliz?
“Você
se acostumara, Milkit. Tudo terá sentido no seu devido tempo.”
“Você
vai esperar por mim até então?”
Flum
se virou para Milkit e sorriu amplamente. “Considere feito!”
Milkit
sentiu um aperto no coração de novo.
Não
queria fazer sua ama esperar. Queria entender esse estranho novo conceito o
mais cedo possível. Não se deu conta de que essa mesma emoção, a ideia de
querer fazer algo por alguém sem receber nada em troca, era precisamente do que
Flum estava falando.
Demoraria
algum tempo até que ela entendesse isso.
“Espera,
espera! Eu preciso disso!!”
Exatamente
no momento em que entraram no Distrito Oeste, as garotas escutaram um homem de
meia-idade gritar freneticamente. Um momento depois, dois homens passaram
correndo perto delas, quase chocando contra Flum e Milkit na sua louca corrida.
“Que
diabos?!”
Os
dois homens pareciam familiares. Eram os aventureiros que estavam bebendo com
Dein na guilda.
“Essa
bolsa parecia terrivelmente cara, Ama.”
“Sim,
não é comum ver algo tão bom aqui no Distrito Oeste... e aquele cara ali parece
que foi vitima de algum tipo de jogo sujo. Escuta, espere aqui por 1 segundo,
Milkit, e cuide das bolsas. Volto em seguida!”
“Farei
isso.”
Flum
rapidamente deixou suas bolsas e saiu atrás dos dois homens, passando sua mão
pela manopla enquanto corria. Embora não fez nada para ajuda-la na sua
agilidade, pensou que um impulso nas suas estatísticas de força não doeria.
A
julgar pela velocidade, os dois homens provavelmente eram mais ou menos de Rank
D... não podiam competir com Flum uma vez que ela tivesse o Devorador de Almas
equipado. Um deles olhou para trás por cima do ombro e viu que ela os
perseguia.
“Que
droga, essa escrava outra vez!” Pelo visto, ao se darem conta que tinham poucas
chances de simplesmente deixa-la para trás, se separaram e fugiram em direções
diferentes.
“Gah.
Parece que tenho que deixar um deles escapar.”
Flum
saiu atrás do homem que segurava a bolsa e o alcançou em questão de segundos.
Parou diante dele e levantou o punho. Puxou uma adaga como se estivesse pronto
para lutar, mas para sua surpresa, atacou-a com magia.
“Bola
de Fogo!”
Esse era um feitiço
lento e de curto alcance, embora pudesse ser mortal nas mãos de um poderoso
feiticeiro. Flum girou seu corpo para fora do caminho, esquivando facilmente do
ataque. Aparentemente esse era o plano do homem o tempo todo, já que aproveitou
a oportunidade para diminuir a distância entre eles, com a adaga apontada
diretamente para o seu coração.
Infelizmente, para ele,
Flum leu seus movimentos com tanta claridade como se a batalha estivesse em
câmera lenta. Talvez o efeito de um encantamento? Agarrou o pulso do homem e o
torceu até escutar um estalo audível quando os ossos cederam. Ela podia até
sentir o estalo através da sua luva.
“Auuuuuuuuugh!!!” O
homem gritou de agonia, deixou cair a adaga e caiu no chão. Seu pulso estava
torcido em um ângulo estranho, os ossos destroçados. Flum ficou surpresa com o
quanto a manopla aumento sua força.
“Gaaugh, doi muito! Por
favor, me ajude!!”
Flum deu uma rápida
olhada no homem que sofria antes de alcançar a bolsa. “Não estou interessada em
ajudar a pessoas como você.”
No entanto, antes que
ela pudesse pegar a bolsa, uma pequena rocha de uns três centímetros de
diâmetro passou voando a uma velocidade incrível. Felizmente, ela conseguiu
retroceder a tempo de vê-lo se chocar contra o pavimento e se esfarelar. Isso
teria doido.
Flum olhou para cima
para ver mais três homens se aproximando. Um estava armado com uma lança, outro
com uma espada e o ultimo com uma funda... provavelmente o que lançou a pedra
em sua direção.
O homem da lança atacou
primeiro. Com cerca de três metros de comprimento, tinha um pouco mais de
alcance que o Devorador de Almas, mas jugando pela facilidade com que Flum
desviou com o lado de sua espada, seu portador não era particularmente hábil.
O próximo foi o homem
com a espada. Flum saiu do caminho quando captou um clarão prateado pelo canto
dos olhos, ante de devolver o golpe com o lado cego da sua própria espada, bem
ao seu lado.
“Nnghoooo!” O homem
voou para trás como se tivesse o golpeado com um enorme martelo.
Enquanto o lanceiro
duvidava sobre o que fazer em seguida, Flum se aproximou ao homem com a funda,
se assegurando manter o seu companheiro entre eles a todo o momento para evitar
que atacasse. O lanceiro lançou outro golpe que voltou a desviar facilmente.
Embora as lanças tenham vantagem no combate à distância, não eram nada em
comparação com a espada quando estava em espaços reduzidos. Flum o acertou de
lado com a parte cego da sua espada, enviando o homem cambaleando ao chão em
agonia igual seu amigo.
Isso deixava só o homem
com a funda. Flum se aproximou dele a um ritmo lento e constante, usando o lado
cego da sua espada para desviar cada pedra que ele enviava. Uma vez que estava
suficientemente perto, levantou a espada e a manteve preparada. Ela estava
pronta para destruí-lo.
“Hyaaaaaaaaaaaaaaaaah!”
Ela balançou a espada
para baixo com uma força imensa... e parou pouco antes de perfurar sua cabeça.
O homem desmaiou de
terror e caiu no chão, a virilha de sua calça escureceu enquanto ele se
molhava. Só então Flum deixou escapar um profundo suspiro de alivio.
Ela havia recolhido a
bolsa roubada e estava girando para voltar com seu dono quando escutou que o
homem que antes havia escapado dela soltar um grito de dor.
“Eh, então, a quem devo
a honra? Suponho que deveria te agradecer por para-lo.”
Flum olhou para onde
ouviu o som para encontra uma pequena figura arrastava a um homem adulto pelo
pescoço. A oradora era uma garota loira de uns dez anos, vestida com uma túnica
branca e que levava uma grande maça. Com sua figura infantil vestida com uma
túnica ondulante, parecia quase como um bicho de pelúcia enorme.
“Uma freira Origem...?”
Sua roupa a delatava. As
únicas pessoas da capital que se vestiam assim eram os discípulos da igreja de
Origem. Maria havia se vestido com uma roupa parecida, e Flum lembrou ter
ouvido que eram treinadas para manejar maças. A palavra “freira” poderia trazer
à mente a imagem de uma mulher santa que usa maia curativa para curar os
feridos, mas Flum achava razoável que eles também fossem treinadas para lutar
contra monstros.
“Eh, parece que você já
cuidou desses caras. Muitíssimo obrigada!”
Depois de agradecer a
Flum, a jovem freira inclinou a cabeça rapidamente antes de esboçar um sorriso
cheio de dentes.
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